Mario Osava, da IPS
O consumo de eletricidade no Brasil crescerá 5,9% até 2019 e, por seus custos menores, a geração hidráulica continuará sendo a principal fonte para atender essa demanda, afirmou no dia 7 o ministro das Minas e Energia (MME), Marcio Zimmermann.
Como dois terços do potencial hidrelétrico do país estão na Amazônia, antecipa-se que persistirão os protestos de ambientalistas, indígenas e outros movimentos sociais contra a construção de grandes represas. É o que acontece hoje com a central de Belo Monte, no Rio Xingu, no Estado do Mato Grosso.
O Plano Decenal de Energia do MME até 2019, colocado em debate público no mês passado, contempla a construção de seis hidrelétricas apenas na bacia do Rio Tapajós, que cruza Mato Grosso e o vizinho Estado do norte, o Pará.
O grande desafio do Brasil é “manter a matriz energética renovável”, para poder cumprir o compromisso assumido na conferência sobre mudança climática de Copenhague, em dezembro do ano passado. Esse programa exige dar prioridade às hidrelétricas, disse Zimmermann em entrevista a correspondentes estrangeiros.
O ministro acrescentou que a única alternativa a essa fonte renovável seria recorrer de modo crescente às centrais termoelétricas, que consomem petróleo ou carvão, o que aumenta as emissões de gases estufa.
Em resposta às cobranças de ambientalistas por maiores investimentos em fontes alternativas, o ministro contrapôs os custos. O consórcio que construirá a central de Belo Monte ofereceu o preço de R$ 77,97 por megawatt/hora, enquanto a energia eólica custou R$ 148 no último leilão do ano passado, citou Zimmermann como exemplo.
Apesar de admitir que o custo da energia eólica caiu quase pela metade nos últimos seis anos, o ministro assegurou que a energia hidrelétrica continuará sendo a mais barata por muito tempo. Só aumenta em países que já esgotaram a potencialidade de seus rios, como a Europa, acrescentou.
O plano energético brasileiro prevê quadruplicar a geração eólica nos próximos dez anos, mas sua participação, apesar deste aumento, não chegará a representar nem 4% do total, enquanto a energia de biomassa se manterá em torno dos 5%.
O Brasil passará dos atuais 112.455 megawatts de capacidade geradora instalada para 167.078 megawatts em 2019, segundo o MME. Nesse contexto, a produção hidrelétrica passará dos atuais 83.169 megawatts para 116.699 megawatts, sendo necessário, para isso, a construção de represas de centenas de quilômetros quadrados.
As projeções oficiais se baseiam em um crescimento econômico anual de 5,1%, média que este ano será ultrapassada, segundo coincidem os analistas. O consumo energético brasileiro sempre cresce mais do que a economia, em grande parte devido ao aumento da população, na razão de mais de dois milhões de pessoas por ano, com a consequente incorporação de novos consumidores e novos equipamentos. O país, com 193 milhões de habitantes, apresenta um consumo por pessoa muito abaixo do registrado no mundo industrializado.
A demanda crescente e a lembrança do grande apagão de 2001, que levou ao racionamento por vários meses, estão por trás do impulso aos grandes projetos energéticos. Além dos complexos hidrelétricos, o Plano Decenal compreende a construção de uma terceira central nuclear e várias termoelétricas a carvão, petróleo industrial e gás natural.
E a voracidade energética brasileira se estende aos países vizinhos, daí a necessidade de serem tecidos convênios bilaterais. O governo federal pretende aproveitar a força dos rios no Peru e na Guiana, onde o MME estima poder contar com grande parte de um potencial próximo dos 14 mil megawatts divididos entre os dois países. Também fazem parte dos planos de Brasília duas hidrelétricas compartilhadas com a Argentina, no fronteiriço Rio Uruguai, com capacidade somada de 2.122 megawatts.
Zimmermann afirmou também que, por esta estratégia, o Brasil não deve ser acusado de “imperialista”, como se insinuou, pois a compra e venda de energia entre Estados é normal em todas as partes do mundo, e neste caso acontece com uma visão de “integração energética”, sem ambições de dominação política. Segundo o ministro, o objetivo é “otimizar” o aproveitamento da geração elétrica. O acordo de intercâmbio com Buenos Aires é um exemplo de mútuo interesse, pois o consumo no país vizinho cresce no inverno devido à calefação, enquanto no Brasil a demanda é maior no verão devido ao uso de ar-condicionado.
O Peru pediu apoio no estudo do potencial energético de seus rios e na construção de centrais hidrelétricas, já que as companhias brasileiras desenvolveram a melhor tecnologia nessa área, explicou o ministro. Entretanto, Zimmermann negou notícias de que os governos dos dois países assinariam um acordo para a construção de cinco novas centrais na Amazônia peruana, cuja eletricidade seria quase totalmente destinada ao Brasil. No momento “são apenas estudos”, disse o ministro à IPS.
Apesar deste desmentido, a construtora Odebrecht já ganhou a concessão para construir a central hidrelétrica e o projeto de energia hidrelétrica e de irrigação Olmos, no noroeste do Peru. O aproveitamento energético dos rios amazônicos já desatou no Brasil uma ampla rejeição, na qual se unem indígenas, o Movimento dos Afetados por Represas, que diz representar um milhão de pessoas expulsas de suas terras, numerosas organizações ambientalistas e cientistas.
Para a central de Belo Monte, que hoje é alvo dos maiores protestos, será necessário inundar 516 quilômetros quadrados. O projeto original, dos anos 80, previa uma represa de 1.250 quilômetros quadrados. O “impacto diminuiu muito” e foi abandonado o plano de construir outros quatro complexos no mesmo Rio Xingu, um dos quais contempla um espelho de água de seis mil quilômetros quadrados, disse o ministro em defesa de seu projeto.
Ambientalistas e biólogos que estudam a vida no rio desmentem a afirmação do ministro e de outras autoridades da área de energia. Afirmam que haverá um impacto direto sobre duas áreas indígenas habitadas por cerca de 200 pessoas. O desvio de parte do rio por dois canais para girar as turbinas reduzirá a água na curva conhecida como Volta Grande, onde vivem os indígenas e milhares de camponeses. A consequência será uma forte redução dos peixes e quelônios, que são o alimento principal desses povos ribeirinhos, afirmam os biólogos
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