Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)
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Humanidade sustentável

Por Jeffrey D. Sachs

Desenvolvimento sustentável significa atingir um crescimento econômico que seja amplamente compartilhado e que proteja os recursos vitais do planeta. Nossa economia mundial atual não é sustentável - mais de um bilhão de pessoas deixadas para trás pelo progresso econômico e o ambiente terrestre sofrendo danos resultantes da atividade humana. Um desenvolvimento sustentável exige a mobilização de novas tecnologias norteadas pelo compartilhamento de valores sociais.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, declarou que o desenvolvimento sustentável está no topo da agenda mundial. Adentramos um período perigoso, em que uma população enorme e crescente, associada a com rápido crescimento econômico, agora ameaça produzir um impacto catastrófico no clima da Terra, na biodiversidade e no suprimento de água potável. Antropoceno é como os cientistas denominam esse novo período - em que os seres humanos tornaram-se os principais causadores de mutações físicas e biológicas na Terra.

O Painel de Sustentabilidade Mundial (PSM) do secretário-geral da ONU publicou um novo relatório que delineia um referencial para o desenvolvimento sustentável. O PSM corretamente observa que o desenvolvimento sustentável tem três vertentes: erradicar a pobreza extrema, garantir que a prosperidade seja compartilhada por todos, - mulheres, jovens e minorias -, e proteger o meio ambiente natural. Esses objetivos podem ser denominados pilares econômico, social e ambiental do desenvolvimento sustentável.

Como poderão as pessoas no mundo, especialmente os pobres, beneficiar-se de eletricidade e acesso a transportes modernos, de uma forma que salve o planeta em vez de destruí-lo? A verdade é que não poderão, a menos que melhoremos as tecnologias.

O PDM exortou os líderes mundiais a adotarem um novo conjunto de Metas de Desenvolvimento Sustentável (MDS) que ajudarão a moldar as políticas e ações mundiais após 2015, ano alvo das Metas de Desenvolvimento do Milénio (MDM). Considerando que o foco das Metas do Milênio é reduzir a pobreza extrema, as MDS deverão contrar-se nos três pilares do desenvolvimento sustentável: erradicar a pobreza extrema, compartilhar os benefícios do desenvolvimento econômico entre toda a sociedade e proteger a Terra.

Uma coisa, é claro, é definir as metas sustentáveis e outra alcançá-las. O problema pode ser percebido examinando um desafio crucial: as mudanças climáticas. Hoje, há sete bilhões de pessoas no planeta, e cada uma é responsável, em média, pela liberação um pouco superior a quatro toneladas de dióxido de carbono na atmosfera por ano. Esse CO2 é emitido quando queimamos carvão, petróleo e gás para produzir eletricidade, conduzir carros ou aquecer nossas casas. Ao todo, os seres humanos lançam cerca de 30 bilhões de toneladas de CO2 por ano na atmosfera, o suficiente para mudar acentuadamente o clima em poucas décadas.

Em 2050, provavelmente haverá mais de nove bilhões de pessoas na Terra. Se essas pessoas forem mais ricas do que as pessoas atualmente são (e, portanto, consumirem mais energia), o total mundial de emissões poderá dobrar ou mesmo triplicar. Esse é o grande dilema: precisamos emitir menos CO2, mas estamos, mundialmente, a caminho de poluir muito mais.

Precisamos nos preocupar com esse cenário porque a permanência em um caminho de crescentes emissões em escala mundial produzirá, certamente, estragos e sofrimento para bilhões de pessoas que serão atingidas por ondas de secas e calor, furacões e muito mais. Já experimentamos o início desse sofrimento nos últimos anos, com uma série de fomes devastadoras, inundações e outros desastres relacionados ao clima.

Então, como poderão as pessoas no mundo - especialmente os pobres - beneficiar-se de mais eletricidade e mais acesso a transportes modernos, mas de uma forma que salve o planeta em vez de destruí-lo? A verdade é que não poderão - a menos que melhoremos as tecnologias que usamos.

Precisamos usar energia com muito mais sabedoria, e ao mesmo tempo precisamos abandonar os combustíveis fósseis e adotar fontes de energia que emitem pouco carbono. Essas melhorias são possíveis e economicamente realistas.

Considere, por exemplo, a ineficiência energética de um automóvel. Nós atualmente movimentamos uma máquina que pesa entre 1 mil e 2 mil quilos para transportar uma ou duas pessoas, cada um pesando talvez 75 quilos. E fazemos isso usando um motor a combustão interna que aproveita apenas uma pequena parte da energia liberada pela queima da gasolina. A maior parte da energia é perdida na forma de calor.

Poderíamos, portanto, conseguir uma grande redução nas emissões de CO2 por meio da adoção de veículos pequenos e leves dotados de motores elétricos de alta eficiência alimentados por baterias carregadas a partir de uma fonte de energia de baixo carbono, como a energia solar. Ainda melhor: adotar veículos elétricos, em vez de continuar usando os atuais, nos permitiria aproveitar os mais avançados recursos de tecnologia da informação para tornar tais veículos inteligentes - suficientemente inteligentes para até mesmo possibilitar que se movimentem sozinhos usando sistemas avançados de processamento de dados e de posicionamento.

Os benefícios das tecnologias de informação e de comunicação podem ser observados em todas as áreas da atividade humana: melhor agricultura utilizando GPS e microdosagem de fertilizantes; fabricação de precisão; edifícios que sabem como consumir menos energia, e, claro, o poder transformador da internet. Recursos de banda larga móvel já estão conectando até mesmo as aldeias mais distantes na zona rural da África e da Índia, reduzindo assim significativamente a necessidade de viagens.

Movimentações bancárias são agora feitas por telefone, assim como uma diversidade crescente de diagnósticos médicos. Livros eletrônicos são transmitidos diretamente para dispositivos portáteis sem necessidade de livrarias, deslocamentos pessoais ou da celulose e do papel nos livros físicos. A educação também baseia-se cada vez mais na internet e em breve permitirá que alunos em toda parte recebam educação de primeira qualidade a um custo marginal quase zero para a inclusão de mais um aluno.

No entanto, para migrar de onde estamos até o desenvolvimento sustentável não dependerá apenas de tecnologia. Isso envolverá também incentivos de mercado, regras governamentais e apoio público à pesquisa e desenvolvimento. Mas ainda mais fundamental do que políticas de governança será o desafio dos valores. Precisamos compreender nosso destino comum e abraçar o desenvolvimento sustentável como um compromisso comum de decência para todos os seres humanos, hoje e no futuro. (Tradução Sergio Blum)

Jeffrey D. Sachs é professor de economia e diretor do Instituto Terra, na Columbia University. Ele é também assessor especial do secretário-geral da ONU para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.

O Brasil é o maior "exportador" de água virtual do mundo /// IHU-Instituto Ethos

O cientista britânico Tony Allan, criador do conceito de água virtual, afirma nesta entrevista que os agricultores detêm a chave para a segurança da água, especialmente no Brasil.

“A forma como usamos a terra e os recursos hídricos no passado negligenciava os impactos ambientais impostos pela agricultura intensiva. Esses custos não se refletem nos preços das commodities alimentícias vendidas e compradas internacionalmente e nem mesmo nos preços dos alimentos no mercado interno. O Brasil não deveria correr para satisfazer a demanda global por sua água, colocando commodities no mercado mundial a preços que impossibilitem que o ambiente das terras e dos recursos hídricos do país seja usado de modo sustentável”.

Essas são palavras do cientista britânico John Anthony Allan nesta entrevista que ele aceitou conceder, por e-mail, à IHU On-Line. Famoso no mundo inteiro por ter criado o conceito de água virtual, explicado a seguir, Tony Allan, como é conhecido, identifica que as grandes economias de água podem ser feitas no setor agrícola, no qual os volumes utilizados são imensos. “Os agricultores tomam conta de toda a água verde. Junto com os engenheiros, eles tomam conta também de toda a água azul usada na agricultura irrigada. Isso representa 80% da água empregada no mundo inteiro. Os agricultores detêm a chave para a segurança da água – especialmente no Brasil”, alerta.

Allan é professor no King’s College de Londres e na Escola de Estudos Orientais e Africanos. Pioneiro em conceitos-chave para a compreensão e a divulgação das questões referentes à problemática da água e à sua conexão com a agricultura, as mudanças climáticas, a economia e a política, foi laureado em 2008 com o Stockholm Water Prize (Prêmio da Água de Estocolmo).

Confira a entrevista.

IHU On-Line: O senhor poderia explicar o conceito de “água virtual”? Como fazer o cálculo de quanto cada produto consome de água?

Tony Allan: Os alimentos e outras commodities necessitam de água para serem produzidos. As commodities alimentícias possuem um teor de água particularmente grande. Veja as quantidades de água que são necessárias para produzir 1 quilo dos seguintes produtos:









Quando uma commodity é exportada de um país para outro, o país importador se torna seguro em termos de água e alimentos, contanto que tenha uma economia que seja diversificada e as pessoas tenham meios de vida que lhes possibilitem comprar alimentos importados. Das 210 economias existentes no mundo, ao menos 160 são economias “importadoras” de água virtual. Há apenas cerca de dez economias que têm um excedente de água significativo que pode ser “exportado” em forma virtual. Esses países incluem os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália, a Argentina e a França. O Brasil é, potencialmente, o maior “exportador” de água virtual do mundo.


IHU: Quais são as maiores consequências ambientais para um país como o Brasil, a partir dessa consideração de ser o maior exportador de água virtual do mundo?

TA: A forma como usamos a terra e os recursos hídricos no passado negligenciava os impactos ambientais impostos pela agricultura intensiva. Esses custos não se refletem nos preços das commodities alimentícias vendidas e compradas internacionalmente e nem mesmo nos preços dos alimentos no mercado interno. O Brasil não deveria correr para satisfazer a demanda global por sua água, colocando commodities no mercado mundial a preços que impossibilitem que o ambiente das terras e dos recursos hídricos do país seja usado de modo sustentável.



IHU: Como podemos fazer para que essa “água virtual” seja contabilizada e informada para os consumidores? O senhor acredita que isso ajudaria na questão da economia desse recurso?

TA: Será muito difícil fazer com que o valor da água usada na produção de alimentos de origem vegetal e animal se reflita no preço desses produtos. Nem os agricultores que produzem as commodities, nem os comerciantes que as tornam disponíveis nas economias importadoras de alimentos, nem seus clientes e consumidores estão conscientes do teor de água embutida nelas e de seu valor. É improvável que a regulamentação cause algum impacto, porque os números sobre o teor de água são muito imprecisos e podem ser facilmente questionados. Educar os consumidores é a maneira mais provável de mudar seu comportamento e sua forma de consumo. Os desafios políticos são imensos, especialmente numa economia de mercado.



IHU: Qual a importância de se divulgar a “pegada da água” e que ações devem ser pensadas como resposta aos resultados apresentados por essa “água virtual”?

TA: O conceito de “pegada de água” é uma forma muito eficaz de contribuir para conscientizar os agricultores, negociantes, supermercados e consumidores a respeito do teor de água das commodities que eles produzem, vendem ou compram e consomem. A comparação da pegada de água de uma dieta à base de carne de gado, que consome 5 m3 de água por dia, com a de uma dieta vegetariana, que consome 2,5 m3 de água por dia, apresenta um resultado crasso. Tem-se demonstrado que uma dieta à base de carne de gado ou de outros produtos de origem animal é muito ruim para a saúde de um indivíduo. E também péssima para o meio ambiente.



IHU: De que forma o tratamento de esgotos contribui para a economia da água? Quanto se gasta de água para fazer um saneamento básico de qualidade?

TA: A maior parte da água é usada para produzir alimentos. Mais de 80% da água que um indivíduo ou uma economia necessita são usados na produção de alimentos e 70% dessa água é verde – ou seja, água proveniente da chuva que é retida no solo. A maior parte da produção agrícola do Brasil vem da água que está no solo. Os outros 30% são constituídos de água azul, ou água doce. A água doce vem dos rios e do lençol freático. A água usada em casa e para trabalhos não agrícolas corresponde a entre 10% e 20% da água de que um indivíduo ou uma economia necessita. A proporção depende de quão industrializada é essa economia e de quão elevado é o padrão de vida do indivíduo. Os efluentes líquidos e o esgoto são gerados pelo uso doméstico e industrial da água. Mediante um investimento considerável, os efluentes podem ser reutilizados. Mas é preciso lembrar que esses efluentes são sempre uma pequena proporção do total de água de que a sociedade necessita. É cada vez mais possível e apropriado que as economias avançadas invistam na reutilização de efluentes. Mas a decisão política de alocar verbas para investir no tratamento de efluentes urbanos tem de ser ponderada levando em conta o valor do investimento em outros setores, como educação, saúde, comunicações, energia etc. A grande economia de água pode ser feita no setor agrícola, em que os volumes de usados são imensos. Os agricultores tomam conta de toda a água verde. Junto com os engenheiros, eles tomam conta de toda a água azul usada na agricultura irrigada. Isso representa 80% da água usada no mundo inteiro. Ou seja, os agricultores detêm a chave para a segurança da água – especialmente no Brasil.

Por Graziela Wolfart, com tradução de Luís Marcos Sander (IHU On-Line/Envolverde) e edição de Benjamin S. Gonçalves (Instituto Ethos)

MAPA DE RISCO DE CONFLITO ARMADO DEVIDO ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS ///

Clique aqui para ver o gráfico com melhor definição e detalhes

O gráfico acima indica os países que correm riscos de conflitos por conta das Mudanças do Clima.

Aqueles que encontram-se em cor vermelha correm riscos mais acentuados de conflitos; aqueles em cor laranja, riscos não tão acentuados e e aqueles em cor azul, pouco risco.

fonte: A Climate of Conflict: The Links Between Climate Change, Peace and War
link: http://www.international-alert.org/climate_change/index.php

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