Russell Mittermeier (presidente da Conservação Internacional – CI) e Fabio Scarano (diretor Executivo da CI-Brasil)
A 10ª Conferência das Partes (COP-10) da Convenção da Organização das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB) está em curso há uma semana em Nagoya, no Japão. Essa é a mais importante das conferências da CDB, por 2010 ser o Ano Internacional da Biodiversidade e pelo fato de o planeta ter atingido o ápice da crise da biodiversidade (taxas sem precedentes de perda de hábitats e extinção de espécies). Além disso, caberá à COP-10 examinar o alcance das metas globais de conservação lançadas em 2002.
A constatação é a de que o mundo fracassou em alcançar as metas traçadas para 2010 e sofreu grande perda de espécies e hábitats. Conforme estimativa do painel do TEEB (A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade), só o desmatamento contribui hoje para uma perda anual de cerca de 2,5 a 4,5 trilhões de dólares, o equivalente ao PIB do Japão, o segundo maior do mundo. Portanto, a perda é grande e a situação é grave, ainda que alguns países como Brasil, Colômbia, Peru, Suriname, Guiana e algumas ilhas do Pacífico, dentre outros, tenham alcançado algum sucesso em proteger muitas de suas áreas.
Diante dessa crise, uma das principais expectativas em torno da conferência de Nagoya é que seja lançado um novo conjunto de metas a ser alcançado até 2020, inclusive especificando os mecanismos e o financiamento para fazê-lo.
Historicamente, a principal e mais efetiva ferramenta na preservação da biodiversidade é a criação de áreas protegidas. Assim, a definição do percentual de superfície continental e marítima do planeta a ser protegido até 2020 vem a ser um dos principais compromissos em torno do qual se espera que os 193 países signatários da convenção selem um acordo.
De forma a subsidiar a discussão entre os negociadores dos países signatários, a Conservação Internacional produziu uma estimativa do quanto seria o mínimo necessário de área continental e marinha a ser protegida no planeta para definitivamente zerar a perda de espécies e, além disso, garantir também que sejam preservados os serviços ambientais decorrentes da biodiversidade que são essenciais à vida humana, como a estabilidade climática, a provisão de água e a segurança alimentar.
O mundo conta hoje com proteção formal de 12,9% da sua superfície continental e de cerca de 0,7% da área oceânica total. Se nos restringirmos à área territorial marítima (até 12 milhas náuticas da costa), 5,9% estão protegidos. Quanto à superfície continental, nossa análise indicou que no mínimo 17% precisariam ser protegidos para conservar a biodiversidade conhecida. Adicionalmente, seria necessária ainda proteção para uma faixa de 6 a 11% de território continental para garantir estocagem adequada de biomassa de carbono em ecossistemas naturais.
Portanto, a nossa estimativa bastante conservadora (já que não estamos incluindo reservas de água, por exemplo) da área continental do planeta que precisaria estar protegida é de 25% da superfície. Quanto à área marinha, a IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza) já apresentara estudo que indicava meta de 20-30% necessária para a proteção da biodiversidade e dos serviços ambientais. Nossa estimativa, igualmente conservadora, é de 15% para 2020, como primeiro largo e significativo passo no sentido de alcançar a meta projetada pela IUCN. É importante ressaltar que esses números seriam o mínimo necessário para preencher as lacunas nas áreas já classificadas como de maior prioridade global para biodiversidade, como os hotspots de biodiversidade e as áreas-chave para a biodiversidade. Estamos elaborando um estudo que indica que, para efetivamente garantirmos a continuidade dos serviços ambientais globais, precisaremos proteger cerca de 50% da superfície do planeta.
Assim, para evitar uma catástrofe ambiental e humana, o mundo precisará no mínimo e como primeiro passo, praticamente dobrar a sua área continental formalmente protegida e aumentar em muitas vezes a extensão da área marítima conservada. Esse empenho requererá investimento financeiro global e responsabilidade na ação local. Nossa expectativa é que o bom senso prevaleça em Nagoya e que se possa chegar a um acordo justo que garanta a sobrevivência desta geração e das próximas.
Carta da Terra
"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)
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