Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

Europa e Estados Unidos: Nas antípodas

ENVOLVERDE                                               Por Mario Soares* Lisboa, Portugal, agosto/2010 – As duas maiores famílias político-ideológicas que em maior medida contribuíram para a unidade europeia foram, indiscutivelmente, a socialista democrata (trabalhistas, socialistas e social-democratas) e a democrata cristã. Acontece que estas famílias estão – há muito tempo – em decadência. A primeira, desde o colapso do universo comunista, entre 1989 e 1990, e a “colonização” neoliberal à qual se submeteu. A segunda, desde as transformações que se seguiram ao Concílio Vaticano II, a partir da década de 70.


Contudo, o Tratado de Maastricht, de 1992, constitui o ponto mais alto da construção europeia. Porém, o Tratado de Nice, que o seguiu, acabou em enorme fracasso. Em lugar de avançar com denodo para uma Europa Política no caminho para os Estados Unidos da Europa, a União Europeia optou pela ampliação, integrando os países do Leste na medida em que foram se libertando das ditaduras comunistas. Sintomaticamente, os novos membros preferiram sempre a Otan e a Comunidade Europeia, por motivos de segurança. Para eles, salvo honrosas exceções, uma União Política não tinha sentido. O que lhes interessava de fato eram os apoios financeiros e econômicos comunitários.

A frustrada tentativa de uma Constituição Europeia, que representasse um avanço em sentido federal, foi obstruída pelo veto francês (e depois holandês). E é preciso reconhecer que nisso influiu o Partido Socialista Francês com suas lutas internas. Desde então, a União Europeia ficou paralisada. E o remendo que in extremis representou o Tratado de Lisboa, de 2007, de inspiração econômica neoliberal, não fez a União avançar, nem em termos institucionais nem políticos, apesar de representar um passo adiante em matéria de direitos humanos.

Os partidos da família democrata-cristã europeia perderam muita força com sua conversão em Partidos Populares, sem preocupações sociais. Na Itália, Espanha e Portugal, as democracias cristãs praticamente desapareceram. A alemã se manteve, mas evoluiu perigosamente para a direita, sobretudo desde que se associou no governo com os liberais.

Na família socialista, o New Labour de Tony Blair com a chamada Terceira Via não só se tornou vassalo da política belicista de Bush como causou estragos na Internacional Socialista em termos de ideologia e de valores éticos e políticos. Na Itália, o partido socialista batizado Democrático perdeu identidade e representatividade. Em toda a União Europeia os governos desta família caíram um após outro. O eleitorado deve ter compreendido que, para fazer uma política de direita, é melhor votar em partidos de direita. Assim, dos 15 governos que a União chegou a ter no final do século passado hoje restam três, em Portugal, Grécia e Espanha, todos Estados do sul, já que na Áustria, embora o primeiro-ministro seja socialista, o governo é de uma coalizão que integra a direita.

Entretanto, o mundo está mudando aceleradamente. Surgiram os Estados Emergentes, que pesam muito e têm visões diversas. Os Estados Unidos têm como presidente uma figura carismática, Barack Obama, cuja visão de mundo e valores é oposta à de seu antecessor Bush, de triste memória. É humanista, pacifista e legítimo herdeiro dos grandes presidentes norte-americanos como Jefferson, Lincoln, Roosevelt e Kennedy.

Um mundo, que atravessa uma crise de extrema complexidade e em plena evolução do fato de a política norte-americana estar dando uma guinada de 180 graus, não parece ser compreendido e certamente não é acompanhado pelos dirigentes políticos europeus. Ao mesmo tempo em que os Estados Unidos estão atacando paulatinamente as causas da crise de maneira que esta não se repita, a União Europeia pensa apenas em reduzir os déficits de orçamento, enquanto ignora os efeitos restritivos sobre o crescimento econômico e a sorte das pessoas.

Com as coisas dessa forma, não é de estranhar que os cidadãos europeus se afastem cada vez mais de seus atuais dirigentes e que comecem a questionar a União Europeia, já que está sendo comprometido o projeto político de paz, de bem-estar e de justiça social que forma a essência de sua identidade. Veremos a volta ao auge dos egoísmos nacionais que nos conduziram a duas terríveis guerras mundiais? IPS/Envolverde

* Mário Soares é ex-presidente e ex-primeiro-ministro de Portugal.

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