Karina Ninni - estadao.com.br
De forma geral os grandes bancos brasileiros não têm políticas voltadas para floresta. Ou, se têm, não fazem questão de divulgá-las. Esta é uma das conclusões do recém-lançado relatório Close the Gap, que estuda a qualidade políticas de crédito e de investimento desenvolvidas por 49 bancos de 17 países.
Foram incluídas no estudo políticas bancárias para segmentos como agricultura, pesca, atividade florestal, mineração, petróleo e gás e geração de energia. Além de avaliar as instituições financeiras, o documento, publicado pela rede internacional Bank Track, que monitora as ações dos bancos voltadas à sustentabilidade, indica lacunas que devem ser preenchidas pelo setor bancário para que o segmento se torne mais responsável social e ambientalmente.
No mundo todo, somente um banco ganhou conceito máximo no setor florestal. Banco do Brasil, Bradesco e Itaú/Unibanco, os bancos brasileiros avaliados, levaram zero. "É possível medir o compromisso de um banco com a sustentabiliadde através do estado de desenvolvimento e da implementação de suas políticas de créditos. É verdade que o Banktrack, instituição sem fins lucrativos que publica o relatório, acompanha somente bancos privados. No caso do Brasil, incluímos o BB porque, apesar de ser público, ele tem atuação mundial em nível mundial muito forte. Então, os resultados aqui apontam para o nível de comprometimento com o meio ambiente que essas instituições têm", afirma o Coordenador do Programa Eco-finanças da Amigos da Terra Amazônia Brasileira, Roland Widmer.
Segundo ele, a grande contradição é que nunca se falou tanto nas vantagens da manutenção da floresta em pé e, em contrapartida, os bancos brasileiros parecem passar ao largo dessa discussão.
"A Amazônia está sendo mundialmente valorizada pelas comodities que ela proporciona. Há uma riqueza imensa e uma falta de cuidado desproporcional referente não somente à Amazônia, mas também ao Cerrado. Essa falta de cuidado crônica com a floresta por parte dos bancos é um paradoxo. Mas esse estado de coisas tem a ver com a taxa de retorno de determinados financiamentos. A verdade é que ainda é mais fácil e mais rápido obter lucro a curto prazo sendo irresponsável".
Widmer cita questão das mudanças climáticas como exemplo do não comprometimento dos bancos com a sustentabilidade. "Quase 50% das emissões brasileiras vêm de atividades ligadas à pecuária. E onde se origina a maior parte das emissões brasileiras? Na Amazônia. Então existe uma emergência para se fazer alguma coisa para que a pecuária seja mais responsável lá. E são os bancos que financiam a pecuária na Amazônia. Ora, se um banco financia atividades na Amazônia, ele sabe que tem boas chances de ter um cliente em não conformidade com a lei. Portanto tem de ter a responsabilidade de ir atrás e checar o que está sendo feito na região com o dinheiro disponibilizado".
Para o vice-presidente do Bradesco, Domingos Figueiredo de Abreu, o crédito é uma ferramenta importante na construção da sustentabilidade, mas as políticas não podem ser modificadas do dia para a noite.
"O Close the Gap funciona como um guia, mas é impossível atingir todas as metas propostas em curto prazo. Temos avançado muito nessa questão. Aderimos, por exemplo, ao Princípio de Equador. Todos os empréstimos acima de cinquenta milhões de reais seguem as diretrizes socioambientais instituídas pelo documento", exemplifica. "Temos plena ciência de que o crédito é um dos pilares que pode nos transformar em uma sociedade mais sustentável".
Além disso, Abreu afirma que é necessária uma logística e pessoal especializado para implementar políticas desse tipo. "No nosso setor de crédito, criamos uma célula específica de análise de risco ambiental. Sabemos que uma empresa com má conduta ambiental pode ter dificuldade de nos pagar lá na frente. Mas a instituição de políticas é um desafio sempre. No Bradesco, toda e qualquer política nesse sentido passa pelo nosso Comitê de Responsabilidade Sócio-Ambiental".
Para Widmer, a responsabilidade de um banco na concesão de crédito não pode se resumir à checagem da documentação do cliente. É preciso acompanhar o bom uso do dinheiro lá na ponta. "Existem meios para isso: fotos de satélite, baratas e com alta resolução, podem dizer ao banco se o sujeito está usando a floresta como disse que usaria. A Serasa tem uma ferramenta hoje chamada 'conformidade ambiental'. Você lança CNPJ de determinada empresa nesse aplicativo e vê seu histórico sócio-ambiental: se ela tem multas por violação do código ambiental, por trabalho escravo. O software checa uma dúzia de bancos de dados".
No caso do setor florestal, o Close the Gap indica que se observem os padrões do FSC (Forest Stewardship Conuncil) para concessão de crédiro para empresas que trabalhem com madeira ou outros produtos florestais. "Não é uma panacéia, pode até não ser o melhor dos mundos, mas é o único padrão que tem certa representatividade, porque de sua elaboração participaram setores da sociedade civil, e não só empresas do setor", resume Widmer.
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