Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

Biomassa incerta

13/05/2011
Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – “As estimativas anuais de áreas desmatadas em florestas tropicais são precisas e altamente confiáveis – pelo menos no Brasil. Mas a utilização desses dados para avaliar as emissões de carbono provenientes de mudanças de uso do solo traz grandes incertezas, principalmente porque o mapeamento da biomassa das florestas é precário.”

A avaliação foi feita por Shaun Quegan, diretor do Centro de Dinâmica do Carbono Terrestre e professor do Departamento de Matemática Aplicada da Universidade de Sheffield (Reino Unido), na abertura do Workshop do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), nesta quarta-feira (11/5), em São Paulo.

O evento de dois dias é destinado aos coordenadores, pesquisadores principais, colaboradores e estudantes dos 17 projetos em andamento do PFPMCG e tem, ainda, a participação de coordenadores e equipes dos projetos de pesquisa dos programas BIOTA-FAPESP e Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN).

Quegan explicou que fazer estimativas das emissões produzidas por mudanças do uso da terra é uma tarefa extremamente difícil, especialmente porque não existem mapas consistentes de biomassa das florestas. Em sua apresentação, ele comparou sete diferentes mapas produzidos por grupos de pesquisa distintos.

“Os mapas são tão diferentes que é impossível pensar até mesmo em uma estimativa em termos de médias. Comparando esses sete mapas de biomassa da Amazônia, que mostram a maneira como a biomassa está distribuída no espaço, efetivamente constatamos que a correlação é zero. Temos a impressão de olhar para algo completamente aleatório”, disse à Agência FAPESP.

Segundo ele, sem mapas mais precisos é impossível avaliar com exatidão as emissões causadas por mudanças no uso da terra e compreender integralmente os fluxos de carbono responsáveis pelo aquecimento global e por outras mudanças climáticas.

“As fontes das emissões continuam sendo um grande problema para a ciência. A biomassa representa o material na árvore, que vai parar em algum lugar quando a floresta é substituída. No que diz respeito ao clima, a questão é que uma parte significativa desse material vai parar na atmosfera”, disse.

Sem saber quanta biomassa é perdida com a queima de uma determinada área de floresta, só obtemos estimativas muito pobres sobre qual é a quantidade de carbono que vai para a atmosfera.

“Se não conhecemos essa quantidade, não sabemos o quanto precisamos reduzir de emissões. Em segundo lugar, sem essas estimativas, não podemos avaliar qual é o teto para permitir mudanças no uso da terra, em termos de área. Saber estimar a biomassa é importante tanto economicamente como cientificamente”, afirmou.

De acordo com Quegan, as tecnologias com base no espaço são importantes para realizar essas estimativas. “Trabalhamos para desenvolver tecnologias de base espacial para realizar as medidas reduzindo esses erros nas estimativas. Temos técnicas já bastante desenvolvidas, com uso de satélites, que têm o objetivo de fornecer mapas de biomassa que sejam globais, imparciais e em escala de metros”, afirmou.

Para que os dados sejam aplicáveis na ciência do clima, além das técnicas de estimativa de biomassa, há necessidade também de desenvolver sistemas de satélites capazes de estimar o desmatamento. Segundo Quegan, o Brasil é uma exceção positiva em relação a esses sistemas.

“Nos países onde há florestas tropicais, o Brasil é a única exceção. O país é o único que possui infraestrutura para medir os dados e fazer os cálculos. A razão para isso é que há mais de 20 anos o país tem sistemas avançados para monitorar o que ocorre na Amazônia”, disse.

Os sistemas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), segundo Quegan, são um exemplo para todo o mundo. “São os mais ambiciosos e importantes programas existentes para monitorar a superfície terrestre em todo o mundo. Outra coisa realmente admirável é que esses dados estão disponíveis gratuitamente na internet. Isso é extraordinário e exemplar”, destacou.

Programa integrado
A abertura do workshop foi conduzida pelo diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, e pelo presidente da coordenação do PFPMCG, Reynaldo Luiz Victoria. De acordo com Brito Cruz, trata-se do primeiro workshop realizado desde que foram contratados os projetos da primeira rodada do programa. O objetivo, segundo ele, é criar oportunidades para uma boa integração entre os vários projetos de pesquisa que compõem o PFPMCG.

“Essa integração é justamente o que justifica a existência de um programa. O workshop, portanto, não é um fato acessório da atividade de pesquisa. É uma atividade essencial das mais importantes, que vai nos ajudar a ter um programa integrado, estabelecendo o diálogo entre os responsáveis por cada projeto. A ciência só avança em ambientes onde há debate e discussão”, afirmou Brito Cruz.

O PFPMCG foi organizado pela FAPESP a partir de uma proposta da comunidade científica. O objetivo é que o programa tenha duração mínima de dez anos. Os projetos avulsos, segundo Brito Cruz, ainda são bem-vindos. “Os novos projetos relacionados com mudanças climáticas que são submetidos ajudam a indicar quais temas poderão ser contemplados em futuras chamadas do programa”, disse.

Há ainda projetos avulsos que podem ser incorporados ao programa. Foi o que ocorreu com o projeto que permitiu, em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), adquirir o supercomputador Tupã, em uso no Inpe para desenvolver novos modelos climáticos. Outro exemplo é a aquisição do novo navio oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP).

Victoria destacou que o PFPMCG envolve não só pesquisadores, mas alunos e pós-doutorandos e que, a partir de agora, os workshops serão realizados pelo menos uma vez por ano.

“Os alunos e pós-doutorandos são importantes para a sinergia do programa, pois estão efetivamente com a mão na massa. Queremos que esse sinergismo nos ajude a detectar novos rumos a tomar, além de indicar possíveis falhas e limitações, revelando novas frentes que poderão ser atacadas em chamadas posteriores”, afirmou.

Mais informações sobre o programa: http://www.fapesp.br/pfpmcg

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