Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

As perspectivas do desenvolvimento sustentável no governo Dilma

Por Oded Grajew, presidente emérito do Instituto Ethos

Em seu primeiro pronunciamento aos brasileiros, depois de proclamada presidente do Brasil, Dilma Rousseff afirmou que seu governo terá como focos centrais a erradicação da pobreza e a recuperação do poder aquisitivo da população. Como o cenário internacional apresenta forte viés protecionista nas principais economias industriais, Dilma também anunciou que o crescimento brasileiro precisará ocorrer baseado no mercado interno.

Essas afirmações trouxeram certa euforia para alguns empresários de setores importantes do país. Já falam em “círculo virtuoso” da economia e “novo ciclo de prosperidade”.


Dilma também mencionou questões referentes ao desenvolvimento sustentável. Tratou como se o tema estivesse em outro setor que não o do combate à miséria e o da valorização do trabalho. Esta foi a minha impressão e espero estar enganado.

Porque se há um caminho a ser trilhado para promover uma sociedade mais justa, na qual meninas e meninos tenham oportunidades iguais para, inclusive, almejarem a presidência da República, esse caminho é o do desenvolvimento sustentável, que pode ser entendido como um modo diferente de se desenvolver, com crescimento econômico, justiça social e equilíbrio ambiental.

E, se há um país onde é possível construir esse modo diferente de desenvolvimento, esse país é o Brasil, por seu vasto patrimônio natural e pelas ações que sociedade civil, empresas e órgãos públicos, em diversas instâncias, vêm adotando.

Sempre é bom lembrar que o Brasil foi um dos poucos países a anunciar meta voluntária de redução de carbono até 2020. O compromisso assumido durante a COP 15, em 2009, foi bastante influenciado pelos empresários reunidos no Fórum Clima. Este compromisso virou lei, a Política Nacional de Mudanças do Clima, sancionada pelo presidente Lula no final do ano passado.

Essa política estabelece que, até 2020, o país deve reduzir as emissões dos gases de efeito estufa entre 36,1% e 38,9%, apontando alguns setores estratégicos nos quais é preciso agir para atingir essa meta: energia, resíduos sólidos, agronegócio, mineração e indústria automotiva, entre outros. Ela precisa, agora, ser regulamentada, especificando prioridades e políticas de incentivos fiscais (e de oneração, quando for o caso) para os diversos setores da economia.

O Fórum Clima já encaminhou sugestões ao governo federal no que tange a essa regulamentação. A principal delas diz respeito a que haja uma referência única para definir a redução das emissões (a lei federal fala em “emissões projetadas” e algumas leis estaduais, como a de São Paulo, falam em “emissões passadas”). Outra demanda do Fórum Clima é a criação de uma agência reguladora para as mudanças do clima.

O empresariado também entende que a biodiversidade é fator de desenvolvimento sustentável e lançou recentemente o Movimento Empresarial pela Biodiversidade, cujos objetivos são aprovar um programa nacional de preservação e uso sustentável da biodiversidade e definir o tema como prioridade estratégica do país.

Clima e biodioversidade impulsionarão a erradicação da miséria se as ações forem planejadas em conjunto com as políticas sociais e se o Brasil também estabelecer o planejamento de longo prazo como “política de Estado”, independentemente de qual governo esteja no comando. Prioridades e metas serão estipuladas depois de amplo debate com a sociedade.

Clima e biodiversidade são, no entanto, problemas globais e dependem de ações globais para serem enfrentados. Por isso, em âmbito internacional, o Brasil precisa consolidar seu protagonismo nos temas. Um dos momentos mais adequados para usar desse “poder” será em 2012, durante a realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que vai ocorrer no Rio de Janeiro. O evento também é conhecido como Rio+20, em referência aos vinte anos da Conferência de 1992 (Eco-92), também realizada no Rio.

A Rio+20 terá dois temas fundamentais, para os quais o Brasil precisará ter posicionamento forte e decisivo. O primeiro é a discussão sobre a contribuição da economia verde para o desenvolvimento sustentável e a eliminação da pobreza. O segundo é a estrutura de governança internacional sobre as questões de mudanças do clima e do desenvolvimento sustentável. O modelo adotado – de decisões por consenso (só quando todos votam a favor) – foi posto em xeque na COP 15, quando divergências entre os países não permitiram consenso sobre ações necessárias para enfrentar o aquecimento global. Como se sabe, a reunião terminou sem acordo.

As respostas bem-sucedidas tanto no combate à miséria quanto na redução de carbono e preservação da diversidade biológica desenham um Brasil de desafios novos e instigantes, pois abre as portas para o país justo que ansiamos construir. Não vamos jogar fora esta oportunidade.

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