Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

Relatório pode ameaçar Florestas Tropicais e a mitigação das Mudanças Climáticas

Mongabay

  Daniel Nepstad[1], PhD
Diretor Executivo e Pesquisador Sênior
Programa IPAM-IP

De 2008 até 2010, o desmatamento nos estados da Amazônia brasileira diminuiu sensivelmente, reduzindo as emissões de CO2 para a atmosfera em aproximadamente 1.5 bilhões de toneladas. Durante esse mesmo período, as 30 nações que têm participação no maior mercado de carbono do mundo – o Programa de Redução de Emissões da União Europeia (EU ETS, em inglês) – reduziram as emissões em cerca de 1.9 bilhões de toneladas (Figura 1). É uma diferença relevante entre esses dois passos extremamente importantes rumo à redução de emissões. O primeiro foi alcançado por meio de doações de aproximadamente 470 milhões de dólares direcionadas ao controle do clima. A segunda envolveu transações financeiras de 411 bilhões de dólares – grosso modo, 875 vezes mais dinheiro. O novo relatório do Greenpeace pode ajudar a frear – ou reverter – o progresso de estados e províncias tropicais ao redor do mundo na Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (REDD, em inglês).

Redução de emissões dos estados da Amazônia brasileira calculada com base em estimativas de taxas de desmatamento do INPE/PRODES (ver Nepstad et al. 2012); Redução de emissões dos países da EU ETS - fonte; Receita estimada de REDD para a Amazônia brasileira - fonte; Transações financeiras estimadas - fonte.

Se os estados da Amazônia brasileira continuarem seu progresso memorável na redução do desmatamento e mitigação das mudanças climáticas, eles precisam com urgência de um sinal de que seus esforços estão sendo reconhecidos e que uma parcela de seus gastos será recuperada (Nepstad et al. 2012). O Ato Soluções para o Aquecimento Global (AB32, na sigla em inglês) realizado na Califórnia (E.U.A.), é uma das poucas possíveis fontes de financiamento para premiar o desempenho de programas estatais de REDD. Se o progresso vai se espalhar para além do Brasil até as principais províncias de desmatamento da Indonésia e para os estados de floresta do México, Peru, Nigéria, então a colaboração de quatro anos entre esses governos através do Fórum Global dos Governadores para Clima e Floresta (GCF, em inglês) deve ser fortalecida e ampliada. Essa colaboração partilha abordagens de estados e províncias no planejamento do uso da terra, nas reformas políticas, aplicação das leis, moratória ou atividades ilegais, melhorias no monitoramento, auxílio moradia e participação das partes interessadas.

O intrigante relatório do Greenpeace mira tanto o decreto de compensação de REDD do estado da Califórnia como o GFC - duas chamas de esperança em um mundo que está falhando em por em prática as duras políticas que serão necessárias para evitar mudanças climáticas catastróficas causadas pelo homem. A lógica do relatório é simples, mas falha. Ele assume que haverá uma compensação de um para um através da medida de compensação por REDD, na melhor das hipóteses com impacto neutro na atmosfera. Ele menciona o regime Lacandona Maya de pagamento por conservação para ilustrar a sua crítica.
  
O relatório critica um novo sistema de compensação de emissões que está nos estágios iniciais de desenvolvimento e há anos de sua implementação. O decreto de compensação de REDD AB32 do estado da Califórnia, que se sobreviver aos ataques e à crise do orçamento, irá conectar as empresas da Califórnia com programas jurisdicionais de REDD. Projetos como o da floresta Lacandon Maya não se qualificariam para compensações a menos que houvesse um impacto mensurável e verificável nas reduções de emissões.

O mecanismo AB32 de compensação por REDD do estado da Califórnia é uma opção entre várias sob consideração dentro do GCF para proporcionar benefícios aos governos e setores críticos da sociedade que estão mantendo as florestas de pé e melhorando os meios de subsistência de comunidades economicamente marginalizadas. Se sobreviver, o mecanismo poderá fornecer uma prova crucial do conceito que poderia enviar uma mensagem extremamente poderosa para governos e sociedades tropicais ao redor do mundo - que programas bem sucedidos de redução significativa do desmatamento tropical e da degradação das florestas serão reconhecidos e recompensados. É no contexto de “Grupos de Trabalho em Compensação por REDD” (ROW, na sigla em inglês), envolvendo representantes da Califórnia, Chiapas e representantes do governo do Acre, junto com especialistas de diversas áreas, que possíveis moldes para esse sistema estão sendo desenvolvidos e estarão em breve disponíveis para a avaliação pública. Esses moldes serão compatíveis com as decisões da REDD+ tomadas dentro da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, em inglês).

A mitigação das Mudanças Climáticas dirigidas pela ONU completa 20 anos e não está progredindo rápido o suficiente. Devemos identificar de forma pragmática todos os potenciais caminhos de curto prazo para redução de emissões em grande escala que podem também proteger e restaurar ecossistemas nativos e outras formas de capital natural, melhorando a vida das comunidades economicamente marginalizadas. Um punhado de estados tropicais está mitigando emissões na escala do Protocolo de Quioto, praticamente fora do radar dos processos de políticas da ONU (Nepstad et al. 2012). É hora de reconhecer e reforçar a inovação que está por trás deste progresso e se certificar de que ela é construída em regimes políticos que serão necessários para reduzir a mudança climática a longo prazo.

Matéria em inglês publicada originalmente em Mongabay.com

Para mais informações:
D. Nepstad, P. Moutinho, W. Boyd, A. Azevedo, T. Bezerra, B. Smid, C. Stickler, O. Stella. 2012. Re-Framing REDD+: Unlocking the potential of REDD+ as the public policy framework for low emission rural development. Research results and recommendations for governments. (English, Portuguese, Spanish) Acesse.
Key recommendations for “re-framing” REDD+ for success. Summarizes the results and recommendations of IPAM’s major study of 13 states and provinces that are building jurisdictional REDD+ programs in five tropical nations; co-published with the University of Colorado Law School.

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[1]
Membro do Grupo de Trabalho em Compensação por REDD do estado da Califórnia.

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