Afra Balazina
O secretário executivo da Convenção do Clima das Nações Unidas (UNFCCC), Yvo de Boer, de 55 anos, anunciou ontem sua renúncia ao cargo, cerca de dois meses após o fracasso da Conferência do Clima de Copenhague. Ele fica no posto até o dia 1º de julho, quando se tornará consultor do grupo KPMG na área climática e de sustentabilidade.Sua saída, porém, não foi recebida com surpresa. Desde meados de 2009 o holandês De Boer afirmava que deixaria o posto. "Foi uma decisão difícil, mas acredito que é o momento certo para o novo desafio, trabalhando com clima e sustentabilidade com o setor privado e o mundo acadêmico", disse, em comunicado. Pessoas próximas dizem que sua saúde estava se deteriorando com o estresse provocado pelo trabalho.
Ele defendeu o criticado acordo obtido na Dinamarca, em dezembro, ao confirmar sua renúncia. "Copenhague não providenciou um acordo claro em termos legais, mas o compromisso político e o senso de direção para um mundo com baixa emissão (de gases de efeito estufa) são impressionantes. Isso requer novas parcerias com o setor privado e agora tenho a chance de ajudar a acontecer."
A ironia e a língua afiada são características de Yvo de Boer. Nas conversas com jornalistas, ele sempre tentava usar metáforas e ser didático.
Integrantes do governo e ambientalistas ouvidos pelo Estado avaliam que a mudança pode ser positiva para o rumo das negociações climáticas, que terminaram de uma forma trágica no ano passado. O objetivo é que os países se comprometam com metas de redução da emissão de gases-estufa para limitar o aumento da temperatura a 2°C - se subir mais do que isso pode haver um desastre climático, segundo pesquisadores. Um acordo forte entre os quase 200 países que integram a UNFCCC pode ocorrer no fim de 2010, em Cancún (México).
O novo secretário executivo será escolhido pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Há delegados que participam das negociações climáticas que consideram provável que uma mulher o substitua, preferencialmente de um país em desenvolvimento. Mas há quem acredite que um brasileiro tenha grandes chances de ganhar a vaga: o embaixador Luiz Alberto Figueiredo, diretor do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty. Em Copenhague, além de ter sido o negociador-chefe do Brasil, Figueiredo atuou como vice-presidente do grupo AWG-LCA, que discute ações de longo prazo para o clima.
O presidente do grupo, o maltês Michael Cutajar, já esteve no cargo hoje ocupado por De Boer, por isso a avaliação é que tenha menos chances que o brasileiro. "A renovação é importante. É como numa corrida com bastão, é preciso parar para tomar fôlego e outro dar continuidade", disse a secretária nacional de Mudanças Climáticas, Suzana Khan. Para ela, o holandês teve um papel "meio fraco em Copenhague". Ela coloca Figueiredo como um dos candidatos mais "prováveis". "Ele é conhecido, articulado e acompanha a negociação há muito tempo."
O consultor do Ministério do Meio Ambiente Tasso Azevedo também considera possível que o brasileiro seja alçado ao cargo. "O mais provável é alguém envolvido, como o Figueiredo, que entende do assunto. Mas podem optar por alguém mais político."
O embaixador brasileiro classifica as apostas de Suzana e Azevedo como "sem fundamento". "O Brasil sempre trabalhou bem com Yvo de Boer. Esperamos que o próximo indicado para ser secretário executivo da convenção tenha a mesma relação com o País", disse Figueiredo.
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reagiu ontem com picardia sobre a possibilidade de uma indicação do embaixador. "Você está me dando essa ideia agora. Estou ouvindo pela primeira vez", afirmou Amorim ao sair de um seminário promovido no Congresso do PT. "O embaixador Figueiredo é um negociador muito competente. Mas, se for para lá, vai nos fazer falta", completou, com o cuidado de não sinalizar sobre o futuro do diplomata.
FRASES
Marcelo Furtado
Diretor executivo do Greenpeace no Brasil
"O mérito de Yvo de Boer foi ter levado o debate do clima para as primeiras páginas dos jornais e a agenda política. Mas faltou diálogo com diferentes grupos - países ricos, emergentes e vulneráveis"
Carlos Scaramuzza
Superintendente de Conservação da WWF
"Na falta de perspectiva atual, mudanças são bem-vindas"
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