Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

IEDI lança propostas para Copenhague e para uma política sustentável para o Brasil

Para a indústria, mais importante que aprovar o acordo é incorporá-lo como fonte inspiradora de ações
02.12.2009 - 18:47

IEDI*

Um acordo climático global ambicioso, como se pretende na 15ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CNUMC) que será realizada de 7 a 18 de dezembro em Copenhague (COP 15), é premente para o mundo enfrentar o gigantesco desafio das mudanças climáticas.

Porém, ainda mais importante do que aprovar o acordo é incorporá-lo como fonte inspiradora de ações nas escalas global, nacional, local e corporativa na transição para uma economia e uma sociedade de baixo carbono. Um novo desenvolvimento se faz urgente e requer a parceria de governos, empresas e sociedade civil na criação de políticas, produtos, serviços e tecnologias pautados por padrões de sustentabilidade.

São relacionadas a seguir propostas e recomendações para reflexões em torno do tema das mudanças climáticas.

Recomendações de propostas para o acordo climático

Meta de longo prazo – Redução de 50% nas emissões globais até 2050 em relação aos níveis de 1990, que contempla corte de 80% nas emissões dos países do Anexo 1 da Convenção do Clima e desvio significativo na trajetória das emissões dos países em desenvolvimento ante o cenário de referência (sem cortes nos gases). A proposta foi recomendada pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, conhecido como AR4 - do inglês Assessment Report 4 - e publicado em 2007) e assumida pelo G-8 em julho, em L´Aquila, na Itália.

Considera-se que, combinada com metas ambiciosas de médio prazo, o corte é necessário para estabilizar a concentração atmosférica de gases-estufa em 450 ppm para que haja 50% de chance de reter o aumento na temperatura média do planeta em 2ºC até 2100. O orçamento de carbono para segurar em no máximo 2ºC o acréscimo na temperatura é estimado em 1,8 trilhão de toneladas de CO2 para os cem anos do século 21. Isso significa que as emissões não poderiam ultrapassar a média anual de 18 bilhões de toneladas, quando já passam dos 40 bilhões.

Meta de médio prazo – O IPCC recomendou diminuição de 25% a 40% nas emissões dos países do Anexo 1 até 2020 ante 1990 e desvio significativo na curva de emissões dos países em desenvolvimento. A União Europeia propõe que esse desvio seja de 15% a 30% em relação ao cenário de referência para 2020. Por causa da antecipação de impactos previstos no relatório de 2007 do IPCC, muitos cientistas recomendam que o piso do corte nos países industrializados seja de 40%.

É, porém, possível ousar um pouco mais na discussão sobre mitigação dos gases-estufa no mundo em desenvolvimento. Talvez a adoção de metas de corte absoluto não seja tão fora de sentido em regiões industrializadas das economias emergentes. O desafio é utilizar tais metas para gerar empregos de boa qualidade e promover desenvolvimento sustentável que ajude a equilibrar as desigualdades sociais, melhorar a qualidade de vida nos grandes centros urbanos e estimular o empreendedorismo e novos negócios sustentáveis.

Namas – Implementação voluntária de Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas (Namas), mensuráveis, reportáveis e verificáveis, registradas no mecanismo de mitigação da Convenção do Clima, com geração de créditos de carbono. Os créditos seriam vendidos a países do Anexo 1 da Convenção para cumprir parcialmente suas metas no segundo período de compromissos, após 2012.

Deve-se ter o cuidado de condicionar a possibilidade de compra desses offsets à adoção de metas ambiciosas pelos países desenvolvidos e limitar a parcela desses créditos no compromisso total de redução da empresa. Do contrário, será muito mais barato cumprir metas com offsets de países em desenvolvimento do que investir na conversão tecnológica da matriz carbonizada.

Redd – O mecanismo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd) valoriza a contribuição das florestas para o clima global. Quase um quinto das emissões globais são oriundas do desmatamento nas florestas tropicais. Ao inserir as florestas no regime climático, será possível canalizar recursos financeiros, técnicos e humanos para criar ou aprimorar sistemas de monitoramento do desmatamento, inventariar as emissões e remunerar populações que colaboram na proteção da mata, como povos indígenas, ribeirinhos, extrativistas e agricultores.

Para o financiamento do Redd, o ideal seria combinar doações, recursos dos leilões de permissões de emissão nos países do Anexo 1 e créditos de carbono gerados por atividades de Redd.

Reforma do MDL – O tema requer estudo mais aprofundado, uma vez que há propostas para flexibilizar o mecanismo, com o intuito de aumentar o volume de operações, mas também se discute o fim do instrumento em países em desenvolvimento com economia avançada, como defendem os europeus. Existem, ainda, as propostas de incluir no MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo) a tecnologia de captura e armazenamento de carbono (CCS) e a energia nuclear, cujas emissões são insignificantes.

A CCS vem ganhando apoio cada vez maior na comunidade de negócios, embora seja vista com desconfiança por ambientalistas, pelo risco de vazamento do carbono. É, de qualquer maneira, uma tecnologia a ser acompanhada com atenção por seu grande potencial de diminuição de emissões. Há bem menos consenso sobre a incorporação da fonte nuclear no MDL, em virtude da falta de solução definitiva para o lixo atômico e dos riscos de segurança. A tecnologia nuclear, contudo, foi incluída nos planos de mudanças climáticas de países influentes no tema como o Reino Unido.

Adaptação – O tema não é tão midiático como o das metas de redução, mas requer atenção prioritária por envolver ações que atenuem o drama já vivido por milhões de pessoas que sofrem as consequências do problema climático. Uma ajuda financeira emergencial deveria ser aprovada na COP-15 para financiar nos próximos três anos a formulação e implementação de planos de adaptação nos países mais vulneráveis.

Financiamento – O compromisso dos países desenvolvidos com o financiamento de ações de mitigação e adaptação nos países em desenvolvimento é uma obrigação prevista na Convenção do Clima. Apesar disso, nenhum país até o momento anunciou quanto está disposto a aportar no futuro fundo de mudanças climáticas que deverá ser instituído no novo acordo climático.

Esteja esse fundo ligado diretamente à Convenção ou a uma agência multilateral com propósito ambiental, a exemplo do Fundo do Meio Ambiente Global (GEF), o que importa é que o mecanismo seja transparente e receba somente recursos adicionais à assistência financeira oficial de desenvolvimento (ODA).

Tecnologia – Os países em desenvolvimento precisam aproveitar o acordo climático para abrir novos canais de desenvolvimento tecnológico em cooperação com outros países do Sul e em alguns casos com financiamento do hemisfério Norte à cooperação Sul-Sul. Há que se conciliar o legítimo direito de os detentores de patentes serem remunerados pelos investimentos pesados em pesquisa com o também direito legítimo de países pobres acessarem tecnologias que tornem mais sustentável o crescimento de suas economias e apoiem planos de adaptação em suas regiões mais vulneráveis.

Possivelmente, um diálogo entre a OMC e a Convenção do Clima seja necessário para adaptar o regime de propriedade intelectual às novas demandas do acordo climático pós-2012.

Recomendações para ações domésticas públicas no Brasil

• Formular uma política de incentivo a projetos de MDL e Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas (Namas), integrada aos eixos centrais das políticas nacionais de desenvolvimento; integrar a política industrial à sustentabilidade; avançar na legislação ambiental, de forma a permitir um maior intercâmbio e integração entre as política de promoção do crescimento e de sustentabilidade;

• Instituir uma política nacional de eficiência energética, articulada com a política nacional de mudanças climáticas (PNMC), com incentivos fiscais a consumidores residenciais, industriais, comerciais e dos setores agropecuário e de serviços e que libere a venda de sobras de energia dos contratos efetuados no mercado livre;

• Criar incentivos fiscais para empresas que reduzem emissões de carbono além de metas definidas na política nacional de clima;

• Priorizar na concessão desses benefícios e na seleção de clientes preferenciais dos bancos públicos empresas com bons indicadores de sustentabilidade, que contemplem programas mensuráveis, reportáveis e verificáveis de redução nas emissões de gases-estufa, melhoria de eficiência energética, aumento no consumo de energia renovável, diminuição no uso de água, menor geração de resíduos e criação de empregos verdes; definição de contrapartidas razoáveis de sustentabilidades aos financiamentos públicos.

Recomendações para ações das empresas

• Estabelecimento de metas corporativas voluntárias para a redução nas emissões de gases-estufa, utilização de fontes energéticas renováveis (PCHs, eólica, biomassa e solar), aumento de eficiência energética e diminuição no consumo de água e na geração de resíduos;

• Lançamento de mesa de diálogo com órgãos públicos, empresas da área de energia, consumidores de energia, ONGs e Ministério Público para construir um pacto pela energia hidráulica sustentável, que defina critérios de consenso para a exploração de novos aproveitamentos hidrelétricos em regiões com ecossistemas sensíveis como a Amazônia;

• Ampliação das parcerias com universidade e outros centros de pesquisa para o desenvolvimento de novas tecnologias e novos negócios sustentáveis nas áreas de biomassa (para a geração elétrica e a produção de biocombustíveis), biodiversidade e biotecnologia, nanotecnologia, novos materiais, energias renováveis, eficiência energética, economia no uso de água, tratamento de resíduos e tecnologia da informação;

• Consolidar a liderança da indústria brasileira na América Latina em negócios sustentáveis, com vistas a exportar produtos, serviços e tecnologias com alto grau de materiais renováveis, balanço neutro em carbono e com matérias-primas provenientes de regiões com padrões elevados de responsabilidade socioambiental auditada ou certificada;

• Programas para capacitar trabalhadores para a economia de baixo carbono (transição para empregos verdes).

* Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial
Link: http://www.iedi.org.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=73&infoid=4239&UserActiveTemplate=iedi

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